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Antidepressivos ligados a risco de morte aumentado



 28 de setembro de 2017 // O uso de antidepressivos está associado a um risco aumentado de morte na população em geral, mas não em pacientes com doença cardiovascular existente, sugerem os resultados de uma meta-análise.

Os achados sustentam a hipótese de que os antidepressivos são nocivos na população em geral, mas nem tanto em pacientes com problemas cardiovasculares, talvez em virtude dos seus efeitos anticoagulantes, observam os pesquisadores.

“O senso comum é que os antidepressivos são seguros e eficazes e, ao tratar pessoas depressivas com estes medicamentos, podemos salvar vidas. No entanto, pesquisas realizadas durante a última década mostram que os antidepressivos são muito menos efetivos do que pensávamos. Nosso estudo faz parte de um grupo de pesquisas que sugere que os antidepressivos são muito menos seguros do que imaginávamos”, disse o pesquisador principal Paul W. Andrews, PhD, do departamento de psicologia, neurociência e comportamento da McMaster University, em Hamilton (Canadá), ao Medscape.

O estudo foi publicado on-line em 14 de setembro no periódico Psychotherapy and Psychosomatics.

Risco similar com tricíclicos e ISRSs

Os pesquisadores avaliaram os efeitos dos antidepressivos sobre a mortalidade por todas as causas e eventos cardiovasculares na população em geral, e em amostras de pacientes com problemas cardiovasculares, em uma meta-análise que incluiu 17 estudos relevantes.

“O tipo da amostra consistentemente moderou os riscos para a saúde”, informam os autores.

Nas amostras de população em geral, o uso de antidepressivos aumentou o risco de morte por qualquer causa em 33% (hazard ratio, HR = 1,33; intervalo de confiança, IC, de 95%, 1,14 - 1,55) e o risco de novos eventos cardiovasculares em 14% (HR = 1,14; IC de 95%, 1,08 - 1,21).

Por outro lado, em pacientes com doença cardiovascular preexistente, o uso de antidepressivos foi associado a uma diminuição não significativa da mortalidade por todas as causas (HR = 0,90; IC de 95%, 0,76 - 1,07) e eventos cardiovasculares (HR = 0,93; IC de 95%, 0,82 - 1,06).

As propriedades anticoagulantes dos antidepressivos “podem facilitar o fluxo sanguíneo para o coração quando os vasos sanguíneos estão bloqueados ou estreitados, diminuindo a probabilidade de eventos cardiovasculares em amostras que exibem esses tipos de patologias e, assim, compensando os efeitos negativos dos antidepressivos”, escrevem os pesquisadores.

Com relação ao risco de mortalidade, os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) não foram significativamente diferentes dos antidepressivos tricíclicos (HR = 1,10; IC de 95%, 0,93 - 1,31). Os antidepressivos foram um moderador significativo de risco apenas porque o risco associado a antidepressivos, exceto os ISRSs e os inibidores da recaptação de serotonina e de norepinefrina, foi significativamente maior do que aquele associado aos antidepressivos tricíclicos (HR = 1,35; IC de 95%, 1,08-1,69).

Estima-se que um em cada 10 americanos use antidepressivos. “Nossas descobertas destacam a necessidade urgente de investigações mais rigorosas sobre os efeitos da mortalidade dos antidepressivos. Eles são utilizados em uma escala muito grande para permitir que esta questão básica de segurança permaneça sem resposta”, escrevem os pesquisadores.

“Precisamos entender como os antidepressivos afetam todos os mecanismos do corpo, não apenas o cérebro, para avaliar a segurança destes medicamentos. Ao bloquear o transportador de serotonina ou de norepinefrina, os antidepressivos impedem que as células em órgãos cruciais absorvam essas substâncias bioquímicas como normalmente fazem. Consequentemente, essas drogas podem prejudicar o funcionamento de muitos processos adaptativos em todo o corpo”, disse o Dr. Andrews.

Os pesquisadores observam no artigo que a maioria dos antidepressivos é prescrita por clínicos gerais na ausência de um diagnóstico psiquiátrico formal.

“Nossos resultados sugerem que os médicos devem ter maior cuidado na avaliação dos custos e benefícios relativos dos antidepressivos para cada paciente individualmente, incluindo uma avaliação do estado cardiovascular”, concluem.

Comentando sobre o estudo para o Medscape, o Dr. Scott Krakower, médico osteopata e chefe da Unidade de Psiquiatria do Zucker Hillside Hospital, em Glen Oaks, Nova York, disse: “Os antidepressivos ajudam a melhorar os sintomas em pacientes com depressão. Eles podem aprimorar a qualidade de vida e o funcionamento de um indivíduo, e evita o agravamento do risco de suicídio."[1] 

“Porém, os antidepressivos podem vir com complicações médicas e efeitos colaterais. O efeito placebo em estudos de depressão também mostrou melhora nos resultados. Portanto, é importante que o profissional tome uma decisão informada sobre o tratamento, levando em consideração o estado clínico atual do paciente e as comorbidades médicas que ele pode ter”, disse o Dr. Krakower.

Dr. Peter D. Kramer, professor de psiquiatria da Brown University, em Providence, Rhode Island, que também revisou o estudo para o Medscape, disse: “Obviamente, quando um grupo apresenta resultados desse tipo, eles chamam nossa atenção – não apenas do público em geral, mas dos clínicos [2] também."[3] 

“Este estudo pode inspirar outras visões gerais[4, ] 5], mas não estou convencido de que ele esteja em um nível que o torne relevante para a prática clínica. Como os métodos podem muito bem permitir fatores de confusão, por si só o resultado não é conclusivo”, observou o Dr. Kramer.

Ele acrescentou: “A grande falácia que análises como essas podem causar é a ‘confusão por indicação’. (Os autores também dizem o mesmo.) Ou seja, as pessoas que precisam de antidepressivos, seja por depressão ou sintomas depressivos de esquizofrenia, ou dor crônica ou qualquer outra indicação, tendem a estar doentes, e pessoas doentes têm maior probabilidade de morrer. Isto é, ser candidato ao uso de antidepressivos é um marcador de risco, incluindo risco de morte”.

O Dr. Kramer também disse: “O achado de excesso de mortalidade em pacientes não cardíacos depende dos ajustes feitos para contabilizar os diferentes níveis de risco nos pacientes com prescrição da medicação e da adequação global dos grupos de controle. Se esses ajustes e comparações forem inadequados, incorreremos na confusão por indicação, isto é, o excesso de morte devido ao excesso de risco em pessoas que os médicos consideram candidatos para o uso de antidepressivos.

“Claramente”, acrescentou ele, “há uma dinâmica especial que impulsiona a prescrição. Talvez com base em indicadores sutis de agravamento os médicos decidam oferecer antidepressivos. Imediatamente após, e talvez por algum tempo, o paciente esteja em alto risco para desfechos ruins – porque o médico identificou com precisão uma crise ou um paciente com algum tipo de desordem debilitante. Não está claro que as formas padrões de “controlar” a presença da depressão de maneira adequada contabilizam ou compensam a diferença entre as pessoas para as quais os médicos prescrevem e não prescrevem antidepressivos”.

O estudo não recebeu verba para pesquisa. Os autores e o Dr. Krakower declararam não possuir nenhum conflito de interesses relevante. Dr. Kramer é o autor do livro, Ordinarily Well, publicado por Farrar, Straus and Giroux. 

Psychother Psychosom. Publicado on-line em 14 de setembro de 2017. Resumo

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